segunda-feira, 1 de junho de 2009

Saudade dos meus quatro anos

Eu não sou, nem quero ser uma mulher maravilha. Não quero ter vida dupla, não quero ser heroína, não quero me sentir gorda, não quero me sentir incompetente, não quero que reclamem dos meus erros, não quero ter que pagar contas e ser lembradas daquelas que não paguei, não quero ser um ombro amigo e ouvir os problemas dos outros, não quero ser gentil aos que me ligam, não quero lavar a louça, não quero alimentar os peixes, não quero dar licença, não quero comprar sapatos novos, não quero pensar na minha roupa, não quero pentear meus cabelos, nem escovar os dentes.

Só uma vez mais, eu queria que alguém me pusesse no colo, me abraçasse, e me disse pra eu não chorar.

"Ouve o barulho do rio, meu filho
Deixa esse som te embalar
As folhas que caem no rio, meu filho
Terminam nas águas do mar
Quando amanhã por acaso faltar
Uma alegria no seu coração
Lembra do som dessas águas de lá
Faz desse rio a sua oração
Lembra, meu filho, passou, passará
Essa certeza, a ciência nos dá
Que vai chover quando o sol se cansar
Para que flores não faltem jamais"

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Insônia

Edredom. Sofá. Televisão. Filme besta. Pensamento besta. Água. Banheiro. Sofá sem edredom. Com edredom. Pensamento besta. Chinelo de quarto. Edredom. Revista da semana passada. Pensamento besta, outro. Computador. Paciência. Chat com estranhos. Estupidez. Pensamento besta, os mesmos. Edredom. Pantufa. Água. Chá. Banheiro. Música. Pensamento. Álbum de fotos. Suspiro. Pantufa. Edredom. Televisão. Filme, outro. Pensamento. Pensamento. Filme. Pantufa. Música. Água nas plantas. Dramim. Dramim. Água. Pantufa. Edredom. Cama. Pantufa. Banheiro. Computador. E-mail. Pantufa. Pensamento besta. Água. Pêra. Cama. Pensamento besta. Dor de cabeça. Pantufa. Aspirina. Água. Banheiro. Deus. Edredom. Sofá. Filme. Cochilo. Amanhecer.

domingo, 24 de maio de 2009

Coisas Que Eu Não Entendo II - Das Vestimentas

Não entendo como nesse clima quente, com verões que nos deixam à beira de 40º, os homens insistam em usar o costume: meias, sapatos, calças, camisa de manga longa, paletó e gravata.

Posso não entender... mas até gosto...

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Coisas que eu não entendo I - Da Educação

Tenho pânico quando as portas do metrô ou do ônibus abrem.

Aliás, mal a condução chega e as pessoas já começam a se apertar. Quando definitivamente as portas se abrem, ai está feito o caos: empurrões, todo mundo exprimido, uma aproveitadinha aqui, outra ali, porque afinal está cheio de gente e não dá pra reclamar, tudo em nome de um lugar pra ficar sentado.

Depois de tudo isso, eu quase sempre acabo em pé: meu físico e meus saltos não me ajudam a me impor nessas situações. E sempre ouço, num repentino surto de educação, geralmente das mesmas pessoas que me atormentaram há poucos momentos atrás e que acabam sentadas confortavelmente: posso segurar sua blusa?

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Sapatos Vermelhos

Rezava apegada em seu terço com tanta concentração e avidez pelo próximo Pai-Nosso, que mal controlava sua respiração. Era uma madrugada fresca, dessas que não faz muito frio, mas quando se esta dentro de um desses casarões antigos, o vento gélido da madrugada parece vir de dentro de seus armários. Por isso usava uma blusa insossa, cinza, por cima daquele seu hábito tão batido.

De repente, fugindo de seu controle, uma lágrima, uma dessas, que toda mulher, casta ou não, sempre deixa escapar. Simplesmente por ser mulher. Renegou isso por tantos anos! Escolhera não ser mulher. Fugiu das leis reprodutivas, controlou seus desejos, esqueceu suas vaidades. Mas aquela lágrima que escorria lentamente, fazendo uma ligeira cócega, era toda a angústia, todo o resultado daquela opressão silenciosa da qual sempre orgulhou-se tanto.

Inveja, Inveja. Sentia inveja. Sentiu a inveja pulsando seu coração. Sentiu-se perdendo o que uma vida levou para construir. Erro. Pecado.

Seu pranto trouxe a aurora; o céu enrubescia, seria reflexo de sua alma maculada? E o dia também trazia a menina de sapatos vermelhos. Desses de bicudos e salto bem alto e fino, de veludo. Ela cheirava mal, era o cheiro do que imaginava ser uma mistura de todos os pecados que tanto repudiava.

Mas a menina ria e gargalhava, e andava de forma ébria do alto daqueles sapatos vermelhos. Sempre quisera ter um assim, eram tão bonitos! Mas nunca pode ter um, diziam-lhe que carregava o pegado, como mulheres de vida fútil.

Mas ela rezava por si, egoísta que era e não pelas atrocidades contra a religião que a menina certamente fazia. Rezava pela fraqueza, pelo medo de seu pecado ser mais grave que aqueles comentidos pela menina. Por que no fundo, dentro de seu coração tão enrustido, a dúvida persistia, a dizimar sua fé: quem sabe, quem sabe se um dia não tivesse tido um, nem precisaria ser tão bonito, se tivesse se privado menos de ser mulher, se tivesse tido um par de sapatos vermelhos, não teria sido mais feliz?

Amor Sem Fim

"Foi um amor sem fim. Namoraram, ficaram noivos.Às tardes, le ia fielmente à casa dela. Assentavam-se nas cadeiras de vime colocadas na calçada e conversavam. Faziam planos para o futuro como fazem todos os noivos. Enquanto isso ela bordava o enxoval. O tempo passou. A canastra do enxoval ficou cheia. E assim continuaram, fazeno planos para o futuro e cuidando do enxoval, ate que ficaram velhinhos. Aí, deixaram de fazer planos para o futuro e passaram a confidenciar memórias do passado. Nunca brigaram. Nunca pensaram em se separar. Foram felizes até que a morte os separou"

Rubem Alves

E eu... ah, eu ando descrete no amor...

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Então... é Natal

- E agradecemos a Deus, em primeiro lugar, por estarmos todos reunidos, diante desta mesa farta...
- Mãe eu quero torta de frango com requeijão
- Shhhhh!
- Farta acima de tudo de amor e união
- Mãããe! Olha o pernil queimando no forno!
Natal em família. Porque Natal que se preze, tem que ser em família. Tem que ser tudo apertado para ressaltar a união. Tem ser tudo farto para destacar a gula. Tem que ser estranho para confirmar que no fundo somos todos iguais.
Há certas tradições que jamais deveriam ser extintas. Comemorar o Natal em família prima em minha lista desde quando eu era neta única e tinha a difícil missão de receber todos os presentes que as pessoas queriam me dar, e que por receber tantos presentes de avós , pais e tios, nem dava muita importância se Papai Noel resolvesse me mandar mais um.
Nunca tive uma família muito grande, mas também nunca achei que precisasse. Tenho no meu pequeno núcleo todas as características para enquadrar aquele conjunto de pessoas como família.
Reunimos-nos no Natal. Todo Natal. E todo o Natal contamos com a missa de Natal, a ceia de Natal e o almoço de Natal, ou seja, dentro da mais absoluta normalidade contando com dois motivos gastronômicos e um religioso, fortes suficientes para por frente a frente pessoas que rosnaram uma para as outras durante o ano inteiro, fazendo-as sorrir e desejar que tenhamos um Feliz Natal em família.
O motivo religioso, a Missa do Galo, é um pano de fundo e serve como intimidador para quando alguém insiste em não dar trégua para as querelas cotidianas do resto do ano.
- Mas é Natal, Rafa! Esqueça essa mesquinharia do seu primo, ele te mostrou o ano inteiro que é devagar, vamos cear em paz!
Também é de grande valia o ponto religioso para domar os estômagos mais vorazes.
- Ai meu Deus! Gula é pecado! Não é porque temos fartura que vamos fazer tudo errado e esquecer o verdadeiro motivo de estamos aqui: o nascimento do Menino Jesus!
Clichê, clichê, clichê.
O dia de Natal em si é sinônimo de marasmo nas ruas, mas intensas atividades em algumas casas. Digo algumas porque noventa por cento das casas na realidade encontrar-se-ão absolutamente vazias, já que as pessoas, por costume ou vadiação, preferem agrupar-se na casa de um parente, dizendo saudar novamente o pobre Menino Jesus.
A casa escolhida, em geral é a menos espaçosa em termos qualitativos para abrigar pessoas, mas com melhor estrutura para gelar cervejas e assar pernis. Nessa época do ano, difícil o cômodo da casa escolhida que não atinja a densidade demográfica de cinco pessoas por cômodo. Incluindo os banheiros, onde sempre é possível encontrar ao menos três crianças tomando banho na banheira, um adulto pra tomar conta e alguém passando mal na privada, seja dos intestinos via arriba ou via abaixo.
É este o momento em que as casas se tornam santuário dos colchonetes. Há colchões, colchonetes e edredons espalhados por cada centímetro da casa, exceto claro, o local onde se encontra o forninho, a churrasqueira e a piscina de mil litros.
De o ato dar um jeitinho para todos dormirem confortáveis, derivou-se um outro hábito peculiar. Devo confessar que nunca entendi muito bem a necessidade de dividir os cômodos entre quartos de dormir de homens e quarto de dormir de mulheres, já que o álibi usado é a manutenção da ordem. Estranho.
Por ser uma data comemorativa típica do verão, alguns lugares ficam intransitáveis, como por exemplo, a cozinha, onde se assam todos os tipos de carne. Aliás, isso me recorda mais uma divisão sexual tipicamente natalina: mulheres, principalmente as que já atingiram mais de cinqüenta anos, têm que preparar assados. Homens, de todas as idades, insistem em fazer churrasco.
O resultado é um pandemônio de carnes de todos os tipos: carneiro à caçador, churrasco de carneiro; frango assado, frango na grelha; cupim assado; picanha no espeto, que obviamente serão não apenas degustadas, mas devoradas impiedosamente por um batalhão de tios pançudos, que para darem conta desta hercúlea tarefa, exigem caixas e mais caixas de latas de cerveja, tão estupidamente geladas quanto eles.
À tarde, para auxiliar a digestão, é hora de relaxar um pouco na piscina. Trezentos litros de água. Setecentos litros restantes são completados por tios corpulentos, que se dividirão em dois times: os que vão contar as mesmas piadas do ano passado e os que vão soltar seus gases na água que os circundam. Não, não errei nas contas, as latinhas sempre ficam na beira da piscina, nunca dentro.
Vale ressaltar que todos os tios – e tios é uma referencia, claro, aos irmãos dos pais e seus respectivos cônjuges e também as pessoas que adotam o estado de tio como estilo de vida - terão queimaduras de até segundo grau, por sua exposição ao sol na piscina. Ficaram exatamente com o mesmo formato e cor que um tomate. Acredito que seja a forma que os vegetais encontram para vingarem toda a indiferença da qual são vítimas durante esse peculiar dia festivo.
Por fim, quando a piscina já estiver esquecida, uma criança certamente curiosa para ver os atrativos que mantiveram os tios dentro da água por tanto tempo irá sorrateiramente mergulhar na piscina, e ser retirada em cima da hora, provavelmente por uma tia que segurava na outra mão uma asinha de galinha tostadinha que sobrara do almoço.
A esta hora, uma prima adolescente atenderá seu telefone e sairá correndo para falar com o amor de sua vida, para que ele não ouça os gritos histéricos e as gargalhadas ensandecias das pessoas que agora fazem comentários de todos os acidentes dos natais passados: a avó que tropeçou e deixou cair o pudim de ameixas, o tio Luiz quando escorregou na piscina e quebrou três costelas, o ano em que o avô vomitou a dentadura...
Adoro Natais. Adoro barulhentas reuniões de famílias. Meu sangue latino não nega o gosto por festas, por barulho.
Amo muito isso afinal, por mais estranho que pareça, porque afinal de contas, as pessoas se mostram em sua verdadeira essência. Não são comedidas, não são educadas, não fazem pose, não sã polidas, não usam roupas caras, não falam de trabalho.
As pessoas são, uma vez por ano, o que querem ser. Não se apegam a convenções e aceitam a si mesmas sem nenhuma falsidade, a não ser claro, as pessoas que são por natureza falsas (e por serem falsas também no dia do Natal, acabam se tornando verdadeiras enquanto falsas).
O Natal talvez se deformou m uma espécie de carnaval. E acho que é isso na verdade que forma o elo religioso, muito além de datas comemorativas do solstício. Acho que são comemorativas, porque finalmente as pessoas encontram o que há de sagrado em sim, em sua essência, seu verdadeiro caminho para se conhecerem. As pessoas são, não mais parecem ser.
Os outros dias acabam não sendo tão santos porque as pessoas se arrependem de serem como são e passam a ser o que acham que tem que ser. Daí da mal-humor (porque tem que ser certinha), dor nas costas (porque tem que ter postura impecável).
Daí-me, por tanto, mais natais durante o ano. Mais natais para que eu possa ficar do lado das pessoas que realmente amo, como realmente são.